Por que o STF validou a revisão da vida toda?

Principais mudanças na Revisão e reflexos Jurídicos

1. O que é a revisão da vida toda?

A revisão da vida toda é o recálculo do valor da aposentadoria. A conta leva em consideração todas as parcelas pagas por uma pessoa desde que começou a contribuir com o INSS e pode elevar o benefício recebido por aposentados e pensionistas.

 

2. Por que o STF validou a revisão da vida toda?

Chegou ao STF o caso de um aposentado que iniciou suas contribuições ao INSS em 1976. Ele começou a receber aposentadoria em 2003 e teve o benefício calculado não pelos pagamentos que fez desde 1976, mas desde 1994. Isso aconteceu devido a uma regra estabelecida pela Reforma da Previdência de 1999 (Veja mais no item 4 abaixo).

Ele recebia R$ 1.493, 59. Se fossem consideradas todas as suas contribuições desde 1976, ele receberia R$ 1.823 – um ganho mensal de R$ 329,41 (22% a mais). Considerando o 13º, a diferença anual seria de R$ 4.282,33.

O cálculo prejudicou o aposentado, que recebia menos do que teria direito caso todas as contribuições que fez durante sua vida tivessem sido consideradas. A decisão do STF para este caso estabeleceu que devem prevalecer todas as contribuições no cálculo do benefício, se o resultado for mais favorável ao segurado.

A corte também determinou que todas as ações pedindo revisão da vida toda que estavam paradas na Justiça podem voltar a andar.

 

3. Quando vale a pena solicitar?

A revisão da vida toda opera por uma lógica contrária à evolução salarial vivida pela maior parte da população: ela beneficia quem recebia mais no início da carreira e passou a receber menos.

Normalmente, trabalhadores iniciam a vida profissional recebendo menos e, conforme ganham experiência e conhecimento, passam a ter salários mais altos.

Assim, na prática, o pedido de revisão da vida toda só é vantajoso para aqueles que recebiam salários mais altos antes de 1º de julho de 1994.

Isso, porque esses valores entrarão no grupo das maiores contribuições feitas ao longo da vida do trabalhador e vão passar a fazer parte do cálculo para a aposentadoria.

 

4. Como o Plano Real e as últimas reformas previdenciárias entram na história?

O Plano Real implantou o Real como moeda vigente no Brasil a partir de 1º de julho de 1994. Antes, a moeda do país era o Cruzeiro Real.

Em 1999, houve uma Reforma da Previdência, que estabeleceu duas regras para se calcular a aposentadoria dos cidadãos. Uma foi a Regra Definitiva e a outra foi a Regra Transitória.

  • Regra Transitória: aplicada para quem já contribuía com o INSS desde antes da troca de moeda no Brasil, ou seja, pessoas que começaram a trabalhar antes de 1999.

 

👉 A ideia da Regra Transitória era abrandar o impacto da Reforma Previdenciária para esse grupo. O cálculo da aposentadoria para essas pessoas considerava 80% das maiores contribuições, mas apenas aquelas feitas a partir de 1º de julho de 1994.

  • Regra Definitiva: foi aplicada para quem começasse a trabalhar com carteira assinada e contribuir com o INSS a partir de 1999.

 

👉 O cálculo da aposentadoria para esse grupo considerava 80% das contribuições de maior porte ao longo de toda a vida.

A Reforma da Previdência de 2019, por sua vez, deu fim à revisão da vida toda. Portanto, quem se aposentou a partir de 2019 não tem o direito de pedir o recálculo da aposentadoria – mas há exceções.

 

Quem já tinha o direito de se aposentar desde antes da reforma de 2019, mas optou por se aposentar depois dessa data pode solicitar a revisão da vida toda. O especialista em Direito Previdenciário João Badari explica que essas pessoas têm o chamado “direito adquirido“.

 

5. Quem pode e quem não pode solicitar a revisão da vida toda

✔️ Pode solicitar o pedido de revisão da vida toda quem cumprir todos os critérios abaixo:

  • Ter recebido a primeira parcela de aposentadoria entre 2013 e 2019;
  • Ter começado a contribuir com o INSS antes da mudança de moeda vigente no país, ou seja, antes de 1º de julho de 1994.

❌ Não tem o direito de solicitar a revisão da vida toda quem:

  • Se aposentou depois da Reforma Previdenciária de 13 de novembro de 2019;
  • Começou a contribuir com o INSS depois da Reforma Previdenciária de 26 de novembro de 1999;
  • Recebeu a primeira parcela da aposentadoria há mais de 10 anos.
 
6. Como solicitar e prazo

Badari explica que a única maneira de solicitar a revisão da vida toda é por meio de ação judicial.

“Não é só pedir no balcão ou pelos canais digitais do INSS. Tem que abrir uma ação judicial”, diz. Ele ainda orienta que aposentados e pensionistas procurem um especialista para fazer o cálculo antes de abrir a ação no poder judiciário.

 

Badari explica que é possível solicitar a revisão sem recorrer a um advogado caso o valor da ação seja inferior a 60 salários mínimos (R$ 79.200 atualmente), mas que isso não é recomendado, devido à complexidade do trabalho documental e contábil.

“Diariamente aparecem para mim casos de aposentados que pediram a ação na Justiça sem advogados e que não conseguiram comprovar seus salários. Alguns conseguiram comprovar, mas não juntaram a documentação correta. E há outros que poderiam receber muito mais, mas não conseguiram demonstrar isso”, relata.

“Vou dar o exemplo do seu José. De R$ 1.500, a aposentadoria dele foi para R$ 1.800. Ele poderia receber mais de R$ 2.500, mas não conseguiu mostrar isso judicialmente e não tem mais como entrar com outra ação”, acrescenta o advogado.

 

Outra orientação do especialista é que quem tenha o direito de solicitar a revisão faça o pedido o mais rápido possível, já que o período decadencial pode impedir a abertura da ação. “Período decadencial” é um termo jurídico e corresponde ao prazo de 10 anos, durante os quais o cidadão tem o direito de pedir o recálculo da aposentadoria.

Até 1º maio de 2023, por exemplo, só poderá solicitar a revisão da vida toda quem tiver recebido a primeira parcela de aposentadoria antes de 1º de maio de 2013, e assim por diante.

 

7. E se a revisão da vida toda se provar prejudicial para aposentados ou pensionistas?

O posicionamento do STF determinou ainda que, caso o resultado do recálculo seja prejudicial para o cidadão, a revisão da vida toda deve ser desconsiderada.

“O segurado que implementou as condições para o benefício previdenciário tem o direito de optar pela regra definitiva, caso esta lhe seja mais favorável”, estabeleceu a corte.

 

João Badari explica que o cidadão não precisa fazer nada caso fique constatado que a revisão da vida toda reduzirá o valor do benefício recebido. “O próprio juiz vai extinguir a ação, argumentando que não há interesse de agir”.

 

8. Número de casos em tramitação na Justiça

Segundo a ministra Rosa Weber, o número de processos de revisão da vida toda suspensos é de 10.700, quantidade considerada baixa por profissionais do Direito. Badari reitera que são poucas as pessoas para quem a revisão da vida toda pode gerar benefícios.

Segundo ele, a quantidade de pessoas que devem se encaixar nos critérios exigidos para a revisão é inferior a 1 milhão, e aquelas que terão ganhos com o recálculo formam um grupo ainda menor.

“Na prática, atuando nos processos, tem ações que dão ganhos de R$ 300 mil, de R$ 400 mil. Mas esses casos são a exceção da exceção”.